No próximo dia 27 de março a Anatel e as operadoras de telecomunicações devem dar início ao processo de introdução da tecnologia de autenticação de chamadas para combate a fraudes e uso abusivo. A adoção da tecnologia, conhecida como stir shaken, está sendo desenvolvida pela agência e pela ABR Telecom com a adesão de 25 operadoras ao projeto.
A ideia é que as chamadas comerciais, feitas por empresas de telemarketing, cobrança ou relacionamento, seja autenticadas, ou seja, venham com um atestado de procedência e identificação clara de quem está chamando, para que o usuário possa decidir se vai ou não atender. As empresas que não aderirem ao stir shaken continuarão obrigadas a adotar o prefixo 0303 (ou, futuramente, o 0304, para cobrança) como forma de coibir abusos e permitir o bloqueio pelo usuário.
Mas há um porém: a adoção em massa do sistema depende de uma atualização em massa dos dispositivos móveis. Isso porque o sistema de stir shaken (a tecnologia adotada é a da Cleartech) não depende de alguns recursos do sistema operacional Android (Google) ou iOS (Apple). Alguns fabricantes que utilizam discadores separados daqueles originais do sistema operacional podem contornar essa limitação, mas também precisam fazer essa atualização de software.
Segundo Gustavo Santana Borges, superintendente de controle de obrigações da Anatel, a adoção do stir shaken deve se dar progressivamente, à medida em que os sistemas operacionais dos usuários sejam atualizados, mas para isso a Anatel depende do fabricante e dos próprios usuários, que precisam aceitar as atualizações. "Estamos em contato com Google e Android, além dos fabricantes representados pela Abinee, para fazer essa atualização o quanto antes, e há boa vontade, mas será uma adoção progressiva".
Segundo Borges, o outro grande desafio da adoção do stir shaken era a preparação da rede das operadoras para integrarem o sistema de autenticação de chamadas. "Havia muitos desafios técnicos e na primeira fase ficamos focados nisso. Talvez pudéssemos ter começado o trabalho de convencer as empresas responsáveis pelos sistemas operacionais a acelerarem a atualização para começarmos com uma base maior de dispositivos compatíveis, mas isso vai acontecer naturalmente", diz o superintendente.
Ele diz que a Anatel ainda está finalizando as conversas com a Abinee e o levantamento total para saber a base de usuários que será beneficiada de imediato. "Há alguns dispositivos que já são plenamente compatíveis, outros que são parcialmente compatíveis e aqueles que não estão aptos", diz ele, sem dar estatísticas ainda. "Ninguém perderá a chamada. Se por alguma razão o celular não for compatível com o stir shaken, a chamada chegará da mesma forma, apenas sem a identificação", diz Gustavo Borges.
Uma outra etapa importante do stir shaken depende das operadoras: é a atração de empresas usuárias que adotem a plataforma, o que está diretamente ligado à viabilização econômica do modelo de autenticação. A ideia é que grandes usuários de telemarketing ou chamadas de relacionamento adotem a plataforma para dar mais credibilidade e segurança aos contatos. Pode parecer paradoxal que alguma empresa de telemarketing ou usuária desse tipo de serviço queira ser identificada, mas Gustavo Santana garante que os dados internacionais mostram que sim. "Quando o usuário sabe exatamente quem está ligando e tem segurança, ele atende mais às chamadas do que quando desconhece o número", diz o superintendente da Anatel, citando a experiência em outros países.
A Anatel optou por seguir um caminho de uma iniciativa não-regulatória. Ou seja, as empresas aderiram ao stir shaken, e a grande novidade no Brasil é dar para as teles a possibilidade de cobrar pelo serviço. Quem não aderir, segue praticando a identificação das chamadas pelo código 0303 (para telemarketing) ou 0304 (para cobrança).
"Além do interesse comercial em fazer a plataforma funcionar para o máximo de usuários, a autenticação trará segurança. Hoje as próprias operadoras e seus clientes são vítimas de fraudes, e existe um benefício geral com a adoção do stir shaken".
Conversa e enforcement
Para promover o uso, a Anatel tem conversas marcadas com a ABT (Associação Brasileira de Telemarketing, que originalmente pensou em ser ela a implementadora do stir shaken, até o projeto ser assumido pelas operadoras), Febraban (bancos) e com outros grandes usuários.
O fato de a adesão no começo ser baixa não preocupa a Anatel. Para a agência, à medida que as pessoas entenderem os benefícios, elas tendem a migrar.
Caso as empresas fabricantes de equipamentos não atualizem o software dos handsets para que eles funcionem com o stir shaken no ritmo desejado pela Anatel, a agência pode criar regras mais duras, eventualmente limitando a certificação de equipamentos não preparados. "Mas essa não é a nossa ideia. Estamos partindo de um modelo de co-regulação, por adesão voluntária do mercado, mas podemos ir para um caminho mais incisivo se for preciso, porque é uma medida importante para o consumidor", sinaliza Gustavo Santana Borges.